KALED É O MAHDI!

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XII. O Inverno

1. Assim disse o Mahdi:

2. Quando Kaled despertou, se encontrava em uma maca de hospital, e ao seu lado, seus guardiões o protegiam de todo o mal.

3. Estes guardiões se vestiam de branco e transmitiam grande bondade e benevolência, mas não se chamavam Semangelof, Sariel, Azrael ou qualquer outro nome com “el”.

4. Os guardiões de Kaled se chamavam Casper e Roxanne.

5. Choravam, tanto o homem quanto a mulher, que se culpavam e se encontravam em profundo arrependimento por deixarem o menino na mansão, agora totalmente destruída.

6. Kaled nunca havia visto seus pais chorarem, pois sempre os considerou como grandes figuras de autoridade e imunes a qualquer sofrimento. Os pais sempre se preocuparam em lhes passar uma imagem de segurança, proteção e exemplo a ser seguido.

7. Kaled, porém, viu dois iranianos frágeis, culpados e inseguros, que cobriam suas caretas para não preocuparem seu filho.

8. “Por que eu fiz isso?”, chorava Casper, “me preocupei tanto em ajudar as crianças de uma cidade distante que não me atentei ao meu próprio filho!”

9. “Eu sou uma irresponsável!”, chorava Roxanne, “eu sabia que Kaled poderia fazer algo perigoso! Eu não deveria ter deixado ele sozinho!”

10. Mesmo tendo contratado uma babá, má ou não, os pais se culpavam, pois estavam longe do filho e não puderam fazer nada por ele, um filho que poderia estar morto.

11. “Não aprendi nada com Gonaz”, disse Casper, com seus olhos marejados, “eu não aprendi nada, eu não deveria ter largado ele.”

12. “Eshgham¹…”, disse Roxanne, “não diga isso, não foi nossa culpa.”

13. “Não foi?”, disse Casper, muito triste para se exaltar, em frustração, “como o terremoto que poderia ter matado nosso filho? Como o… o…”

14. Lembrando da terrível tragédia que ocorreu em sua mente, Casper tornou a chorar novamente, e Kaled, que já havia acordado, também começou a chorar, pois também começou a sentir imensa culpa.

15. Isso pois bem sabia que a destruição da mansão aconteceu por sua causa, ao tentar se defender da nefasta Mera. Inocente, a criança imaginou que tanta exibição de poder seria um momento glorioso e de heroísmo.

16. Mas a verdade lhe acertou como uma faca em seu peito quando viu que a violência apenas trouxe sofrimento aos seus pais e à si próprio, pois perdera seus tão preciosos livros, seus instrumentos musicais e seus brinquedos.

17. Os pais perderam muitas memórias do passado, exceto por uma única foto que conseguiram encontrar em meio aos escombros. Lhes partiu o coração, porém, quando viram que, nem mesmo o belo jardim, tão cheio de vida e de cor, sobreviveu em meio a tanta destruição.

18. As flores haviam murchado, a grama havia queimado, a água havia secado e os animais estavam mortos, e diferente de antes, tal imagem trazia grande tristeza ao coração dos pais, pois pior do que uma tragédia era a falsa esperança de que as coisas poderiam ser diferentes e a tragédia não tornaria a se repetir.

19. A única coisa que lhe restara foi seu cachecol, que abraçava enquanto começava a refletir sobre o que havia ocorrido.

20. “Nada disso teria acontecido se eu não tivesse utilizado meus truques”, pensava Kaled.

21. “Se eu fosse uma criança normal como todas as outras, nada disso teria acontecido”, começou a se indagar, profundamente triste.

22. “As minhas professoras tinham razão, eu sou um monstro, eu destruí tudo”, pensava Kaled, e sem ter proferido uma única palavra, chorava e não conseguia mais conter suas lágrimas em seus olhos.

23. Sua mãe lhe passou a mão em seus cabelos, o que apenas fez Kaled chorar ainda mais, se sentindo impune e de mãos sujas, como se fosse injusto ter feito o que fez e seus pais continuarem lhe amando tanto.

24. “Fui eu, mamãe!”, dizia Kaled, “fui eu quem destruí tudo!”

25. Ambos os pais se aproximavam de Kaled para lhe abraçar, mas o filho se afastava dos pais, pois queria ficar sozinho.

26. Roxanne queria não olhar, mas não deixava de notar cicatrizes e pontos cirurgicamente costurados na região de seu coração, onde antes havia um corte profundo onde Mera havia lhe apunhalado com sua adaga.

27. Ninguém, porém, soube do que realmente aconteceu, pois os adultos não acreditavam nas histórias do filho, que além de falar em corvos falantes e cobras, falava que um terremoto foi culpa de uma simples criança.

28. Além disso, Mera havia desaparecido e foi dada como morta pouco tempo depois, pois nenhum rastro seu foi encontrado debaixo dos escombros.

29. Casper arcou com os custos do funeral simbólico de Mera, e apesar de ricos, os Navid não poderiam comprar o amor de uma mãe por qualquer valor em rial.

30. Apesar de nefasta e maligna, Mera também tinha uma mãe e deixou um irmão e duas irmãs para trás. Casper e Roxanne encontraram as 3 crianças chorando no túmulo de Mera quando compareceram ao seu funeral.

31. A mãe de Mera se culpava e dizia que não esteve tão presente na vida de sua filha para lhe proteger e lhe defender, e agora que se foi, não tinha mais como recuperar o tempo perdido.

32. A partir daquela tragédia em diante, os pais e o filho fizeram uma promessa cada. Enquanto Kaled prometeu nunca mais usar a violência ou a magia, Roxanne e Casper juraram não abandonar seu filho para trás, nunca mais.

33. Por esta razão, desistiram de levar o menino para alguma escola e passaram a ensinar o filho dentro de casa para que não se afastassem de Kaled.

34. Apesar de ilegal no irã, os pais receberam a permissão dos mullahs do tribunal da xária após muita insistência, pois os mestres da lei escutaram os relatos das professoras anteriores e perceberam que a criança era um caso perdido e seria impossível colocá-la em uma escola.

35. Os Navid construíram uma nova casa em outro bairro de Teerã, morando mais afastados de seus amigos. Casper largou seu emprego como repórter para voltar a trabalhar em casa como colunista, enquanto Roxanne apenas deixou de trabalhar para virar dona da casa.

36. Samira notava como os pais haviam mudado, se tornando mais tradicionais e rígidos. Ambos já não se importavam mais com atos políticos e acreditavam que, seguindo a fé, poderia evitar mais problemas do que já acumularam nas costas.

37. O menino Kaled também já não deixava seus aposentos em sua nova casa. Sempre preferiu ler seus livros e ficar sozinho. Contudo, a criança também deixou de ver outras crianças, ficando entre as 4 paredes do lar por maior parte do seu tempo.

38. Chegara então o sétimo ramadã de Kaled Navid, que ocorreu durante o inverno de Teerã, tempo em que as famílias levavam suas crianças para brincar na neve e no gelo.

39. E para “quebrar o gelo”, os pais decidiram sair com seu filho para que pudesse dar um oi aos seus velhos amigos, quando brincaram pela primeira vez no parquinho e na areia.

40. Roxanne e Casper saíram de casa com seus belos casacos e luvas, enquanto Kaled vestia um casaco fofo e enorme que o transformava em uma bolinha, além é claro de seu inseparável cachecol.

41. Apesar de comum em Teerã, neve não deixava de ser um evento especial e um tanto raro, sempre maravilhando os iranianos entre bonecos de neve e guerras de bola de neve.

42. Na praça da cidade, podiam observar moradores tirando neve da calçada com suas pás, crianças se deitando no chão e fazendo anjinhos de neve e adolescentes elegantes fazendo patinação no gelo.

43. Sentados em um banco da praça, os pais do menino o observavam desenhar na neve para se distrair, o que lhes trazia menor preocupação, pois quanto mais quieto e mais perto dos pais o menino estava, melhor.

44. Tirando os olhos de Kaled, Roxanne observou uma adolescente jogando uma bola de neve na direção de um rapaz. Diferente das outras mulheres, a adolescente exibia bastante cabelo e vestia roupas mais modernas e elegantes.

45. O rapaz atingido pela bola de neve encarou a adolescente, e rindo, escavou uma enorme bola de neve do tamanho de uma cabeça, fazendo a garota se afastar antes de ser atingida pela bola de neve, caindo no chão em gargalhadas.

46. Havia outro homem junto com os dois, e portando uma câmera fotográfica, chamou o rapaz e a adolescente para tirar uma foto para recordação, segurando a câmera com uma mão e gesticulando com a outra.

47. Casper sorria ao ver o rapaz estender a mão para a moça para que pudesse se levantar, e então, apertando sua mão e olhando para a câmera de seu amigo.

48. Enquanto observavam os jovens, Casper apertava a mão de Roxanne, que deitou sua cabeça no ombro de seu marido.

49. Após um flash, a adolescente empurrou o rapaz, que distraído, caiu no chão. Como crianças, o casal começou a correr pela neve.

50. “Foi aqui, não foi?”, disse Roxanne, pensativa e confortável.

51. “Nosso primeiro encontro”, disse Casper, sorrindo, “você estava tão linda.”

52. “Lembra quando a gente se encontrava atrás da biblioteca?”, relembrava Roxanne, se sentindo uma adolescente outra vez, “você sempre trazia algo de bom para a gente comer.”

53. “Então você só gostava dos meus lanches?”, ria Casper, e Roxanne riu de volta, balançando a cabeça.

54. “Eu só contava sobre a gente para Samira”, dizia Roxanne, olhando para o nada, “e mesmo assim, ela falava que eu ia me meter em encrenca.”

55. “Ela sempre foi muito careta”, disse Casper, que fazia carinho na mão de Roxanne.

56. “Samira e Aurang eram tão caretas!”, ria Roxanne, “tão comportadinhos, enquanto a gente não tinha a menor vergonha de ser o que a gente era de verdade.”

57. “Você era muito ousada”, dizia Casper, “até usava maquiagem no rosto.”

58. Pensativo, Casper disse: “Aurang também era ousado, só era um pouco cabeça dura.”

59. De repente, Casper entrou em silêncio, olhando fixamente para o nada e pensando na vida de sua família.

60. “Espero que Aurang esteja bem”, dizia Roxanne, sentindo saudades dos tempos de ouro da faculdade.

61. “É… os bons tempos sempre se vão, não é mesmo?”, dizia Casper, que limpava seus óculos cheios de neve.

62. “Quando a gente era mais jovem, tudo era mais simples”, dizia Roxanne, “por isso que a gente gosta de ter filhos.”

63. “…para trazer os bons tempos de novo”, completou Casper, que agora olhava para Kaled, que patinava no gelo.

64. Roxanne percebia, através do olhar de seu marido, que Casper estava melancólico e pensava muito sobre o passado, especificamente, o que havia ocorrido há 12 anos.

65. O homem barbudo tirou uma foto do bolso de seu casaco, e a foto exibia uma criança de gorro rosa brincando na neve, um pouco danificada graças à tragédia anterior.

66. O pai colocara a foto lado a lado à sua visão do menino Kaled, que também brincava na neve, exatamente como a menina da foto.

67. “Os tempos bons sempre terminam”, dizia Casper, “tudo tem um fim.”

68. Os pais então tornaram a observar seu filho brincando no parquinho, acreditando ver uma criança agitada e divertida, rindo e fazendo coisas de criança.

69. Kaled, contudo, era rejeitado pelas crianças, pois seus pais sabiam que o tal “filho dos Navid” era a criança esquisita que foi expulsa de dezenas de escolas pela cidade.

70. O menino se sentava triste em sua cadeira de balanço, cabisbaixo, pois diferente de antes, nenhuma criança retornou para lhe empurrar.

71. Vendo a tristeza do menino, seus pais se levantaram do banco onde se sentavam para brincar com Kaled.

72. “Mas os tempos bons também recomeçam”, disse Roxanne ao seu marido.

73. E empurrando o balanço, Kaled começou a sorrir outra vez, assim como Casper, que ajudava sua esposa a empurrar as costas do menino.

74. Kaled então pediu para descer, pois não queria brincar de balanço, e então, Roxanne olhou nos olhos de Casper, que também olhava em seus olhos.

75. “Que tal uma segunda chance para o recomeço?”, disse Roxanne, sorrindo serenamente para seu homem.

76. Uma bola de neve então lhe acertou em cheio em seu braço, e quando Casper olhou para o lado, viu Kaled gargalhar tanto que parecia que ia ficar sem ar.

77. “Agora você vai ver só!”, disse Casper, que correu na direção de Kaled para agarrá-lo.

78. “Te peguei!”, falava Casper, erguendo o menino para o alto e lhe fazendo cócegas.

79. Para resgatar o filho das garras do terrível Casper, Roxanne então atendeu ao chamado e acertou uma bola de neve na cabeça do pai.

80. “Você também?”, disse Casper, que viu Roxanne rir e se afastar para que o pai não lhe ameaçasse acertar bolas de neve.

81. Juntos, Kaled e Casper formaram várias bolas de neve e correram na direção de Roxanne, que se protegia por todos os lados com seus braços, mas de nada adiantava, pois as forças de pai e filho eram imbatíveis e ninguém estava a salvo, nem mesmo sua mãe.

82. Pai, mãe e filho se divertiram entre fortes de neve e bonecos por toda a tarde, até que se cansaram e foram para casa para celebrar a noite de Yalda.

83. Em casa, Casper e Roxanne comiam quitudes e colocavam a conversa em dia com Samira e seus amigos, enquanto Kaled brincava com os filhos das amigas e amigos de Roxanne.

84. Chegara então o aniversário de 7 anos de Kaled, idade essa pela qual seus pais julgaram ótima para que o filho atendesse aos ritos e costumes do islã e se tornasse um verdadeiro muçulmano.

85. Afinal, se o menino era sábio o suficiente para ler filosofia e tocar flauta com grande excelência, era capaz de cumprir com os cinco pilares da religião.

86. O primeiro pilar do islã, o shahadah, consiste em aceitar ALLAH como o único e verdadeiro Deus na terra e o profeta Mohammed como o seu mensageiro.

87. Ao aceitar ALLAH como único Deus onipotente, onipresente e onisciente, também é aceito que ALLAH é a única divindade criadora por meio da qual a criação foi realizada através da substância de ALLAH.

88. Assim sendo, não há de haver outra divindade que compartilhe da substância de ALLAH, pois ALLAH é o inefável e o íntegro, indivisível em trindade, tripartite, emanações ou sefirots.

89. O segundo pilar do islã é o sawm, rito que sempre fora seguido por Kaled e seus pais desde seu nascimento, pois se trata do jejum diário realizado no mês de ramadã, encerrando-se todo pôr do sol.

90. Ao jejuar, o fiel se purifica dos prazeres da carne e se liberta das necessidades físicas, alcançando assim maior riqueza e ascensão espiritual.

91. No sétimo ramadã, Kaled foi ensinado pelos pais a agir de maneira mais prudente e disciplinada, encorajando o filho a ir à mesquita para orar e louvar à ALLAH junto de seus irmãos e irmãs em Deus.

92. O menino sempre se distraía vez ou outra para poder se divertir e brincar com outras crianças na mesquita, mas os pais lhe repreendiam e lhe mandavam se comportar.

93. O terceiro pilar do islã, o salat, consiste nas 5 orações diárias feitas no secreto, sempre feitas ao nascer do sol, antes do meio-dia, ao entardecer, antes do pôr do sol e antes de dormir.

94. Kaled orava por cerca de 3 minutos em seu tapete, saudando “Allahu akbar” e conversando com ALLAH, em busca de respostas para a vida.

95. Quando acordava, pedia para que seu dia fosse bem. Antes de almoçar, agradecia pelo alimento. No meio da tarde, fazia perguntas sobre a vida. Ao pôr do sol, falava das histórias que lia em seus livros. Antes de dormir, agradecia por mais uma noite sem ver Mera, a nefasta babá.

96. Vez ou outra, Kaled pedia para falar com outras pessoas além de ALLAH, como o profeta Eli ou o príncipe Siddartha, pois queria saber como era a vida dos grandes profetas e como eles resolveriam os problemas que enfrentava.

97. Vez ou outra, Kaled pedia para falar com outras pessoas além de ALLAH, como o profeta Eli ou o príncipe Siddartha, pois queria saber como era a vida dos grandes profetas e como eles resolveriam os problemas que enfrentava.

98. “Papai do céu, posso falar com Zaratustra?”, orava Kaled, “um garoto muito malvado falou mal de mim hoje, me disse que eu sou estranho porque nunca posso sair de casa, mas Zaratustra vivia sozinho e todos achavam ele legal.”

99. Quando Roxanne via que Kaled orava para outras entidades além de ALLAH, contudo, o repreendia e falava que era pecado, pois já estava quebrando o primeiro pilar do islã.

100. Kaled tentou questionar o que havia de errado em orar para outras pessoas, mesmo elas não sendo deuses, mas Roxanne levantou a voz e insistiu que Kaled não deveria fazer isso, e obedecendo sua mãe, Kaled parou de orar para Zaratustra, Eli e Siddartha.

101. O menino continuava, contudo, a ler seus ensinamentos em segredo, pois os pais também já não juntavam livros de outras religiões em sua estante.

102. Para todos da família, era simples cumprir com o quarto pilar do islã, o zakat, pois sempre foram caridosos e solidários, sempre ajudando aos pobres e necessitados.

103. Mesmo parecendo tão simples, Kaled não entendia o porquê de as pessoas ignorarem os moradores de rua que pediam esmola, como se os tratassem como gente invisível.

104. Diferente da maioria, Kaled sempre deixava algum dinheiro para os mendigos, que se alegravam e se juntavam em volta do menino sempre que passava na rua, pois sabiam que ele era filho de pais ricos.

105. Mas certa vez, um maltrapilho qualquer havia assediado Roxanne na rua e Casper lhe agredira. A bebida alcóolica era ilegal no irã, então o maltrapilho só era máu-caráter.

106. Os homens que passavam em volta julgavam Roxanne, dizendo que isso havia acontecido pois estava exibindo suas mechas de cabelo, apesar de vestindo seu longo hijab.

107. Desde então, os pais encorajaram o filho a não dar atenção aos mendigos. “Nunca se sabe”, eles diziam.

108. “Mas mamãe, não é só porque um maltrapilho lhe maltratou que todos os demais são do mesmo jeito”, dizia Kaled.

109. “Esse é o problema”, dizia Roxanne, “não tem como saber quem é bom ou quem é ruim.”

110. Assim, Kaled ajudava os necessitados apenas em certas ocasiões, mas ainda faltava cumprir com o quinto e último pilar para que o menino se tornasse um muçulmano verdadeiro: o hajj.

111. Todos os dias, Kaled orava de joelhos em seu tapete, de frente para sua pequena televisão de tubo que foi colocada estrategicamente por Roxanne na direção da qiblah, que é a direção da Caaba, localizada na cidade de Meca.

112. Quando sua mãe lhe contou sobre a Caaba, Kaled lhe perguntou: “É verdade que a Caaba é a casa de Deus?”

113. Roxanne então lhe disse: “Deus mora nos nossos corações, ele não tem uma casa.”

114. “Mas ninguém pode entrar na Caaba, então é como se fosse a casa dele, não é?”, perguntou Kaled.

115. “Mais ou menos”, respondeu Roxanne.

116. “Não entendi, disse Kaled, “ele pode visitar a nossa casa, mas a gente não pode visitar a casa dele?”

117. Foi aí então que Casper abriu a porta do quarto de Kaled, empolgado e contente.

118. “Que tal uma viagem em família?”, dizia Casper, sorrindo.

119. “Uma viagem? Para onde?”, perguntou Roxanne, sem entender.

120. “Oras, para onde mais?”, disse Casper, como se fosse um tanto óbvio, “para Meca, é claro!”

121. “Melhor não”, disse Roxanne, preocupada, “não vamos deixar o Kaled aqui em casa.”

122. Roxanne dissera isso pois, além do que haviam passado antes, o casal sempre viajou sozinho para o hajj, mas após Casper explicar que Kaled já está grande para ir para Meca junto com os pais, Roxanne fica mais aliviada.

123. “Eu vou para Meca? Eba!”, dizia Kaled, que começou a pular de felicidade, pois sabia que Meca era uma cidade muito, mas muito importante para os muçulmanos. É como Orlando é para os estadunidenses ou o Japão é para os otakus. Não sei, acho que é assim.

124. “Mas nós não vamos direto para Meca”, disse Casper, que começou a abrir um mapa, empolgado, “primeiro, vamos fazer um passeio turístico por algumas cidades!”

125. “Que cidades?”, disse Roxanne, se aproximando ao lado de seu esposo para olhar o mapa.

126. “O que acha de Dubai?”, disse Casper, olhando um olhar charmoso para Roxanne.

127. “Amor, você sabe me surpreender”, disse Roxanne, se reapaixonando por Casper.

128. “Eu já posso arrumar minhas roupas?”, disse Kaled, que dava pulinhos de animação.

129. E após a confirmação do pai, a família começou a se preparar para uma grande viagem, partindo então de avião três dias depois, embarcando no aeroporto internacional de Teerã e desembarcando na cidade de Xiraz, no sul do Irã.

130. Os pais escolhiam cuidadosamente quais peças eles deveriam ou não levar, enquanto Kaled levava algumas peças de roupa, muitos livros e muitos brinquedos.

131. No dia da viagem, Casper, Kaled e Roxanne se sentaram um ao lado do outro e ouviam as instruções da comissária de bordo sobre o uso das máscaras de oxigênio e as saídas de emergência localizadas nas asas e nas regiões dianteiras e traseiras da aeronave, além do uso do cinto de segurança.

132. Roxanne, porém, queria procurar por um paraquedas, pois tremia de medo e ficava paralisada em seu assento, evitando olhar para a janela ao lado.

133. “Você tem medo de avião, mamãe?”, perguntou Kaled, rindo.

134. “Eu? Eu viajo de avião o tempo todo”, disse Roxanne, e logo em seguida, o avião começou a acelerar para levantar vôo.

135. “Allahu akbar!”, disse a mãe, que se segurava ainda mais firme em seu assento e olhava para frente com um olhar assustado.

136. Mesmo sentado entre Casper e Roxanne, Kaled se levantou até o colo de sua mãe para poder olhar pela janela, se maravilhando com as nuvens e os montes Elbruz.

137. Se sentindo como um pássaro, pôde ver o avião flutuar por cima das ruas de Teerã e observou os carros indo para um lado e para o outro como se fossem formiguinhas.

138. “Deve ser assim que Deus vê a gente”, dizia Kaled, com a cara prensada ao vidro.

139. O avião levantou vôo em direção ao sul, sobrevoando por cima das nuvens brancas do céu, cujas Kaled acreditava serem feitas de neve, pois a neve caía do céu assim como a chuva, que acreditava ser neve derretida.

140. Perdido em sua própria cabeça, Kaled se imaginou brincando no céu, voando como um pássaro e brincando com a neve das nuvens.

141. Se imaginou flutuando então em meio ao céu estrelado, debaixo da luz da lua, onde poderia ver todas as crianças do mundo lá de cima, e sempre que alguém precisasse de ajuda, era só ele ir até elas e ajudar.

142. Por um momento, Kaled pôde jurar que se viu do lado de fora do avião, voando de verdade por meio de ilhas voadoras cheias de pássaros, dragões e outras criaturas místicas, mas após a lucidez retornar, viu que do lado de fora não havia nenhum menino das nuvens.

143. “Não, isso é magia, magia é errado”, pensou Kaled, deixando de usar sua imaginação, “quem usa a magia é o diabo.”

144. O avião aterrissou horas depois no aeroporto de Xiraz, onde os pais e o filho aguardavam por suas bagagens para partir até uma pousada onde se hospedariam por um dia, antes da viagem até Dubai, nos Emirados Árabes.

145. Durante o desembarque, o telefone de Casper vibrou em seu bolso, a após abrir o telefone e levantar sua antena, viu que um colega de trabalho lhe chamava.

146. Casper então atendeu a chamada e colocou o telefone em seu ouvido, o apoiando com o ombro.

147. “Alô? Senhor Navid?”, dizia o colega, do outro lado da linha, “Você ficou sabendo da matéria da seção de atualidades?”

148. “Sobre o tal do Mahdi? O que tem?”, disse Casper, enquanto buscava suas bagagens no desembarque.

149. “Sim! Vai sair no jornal daqui a pouco! Está onde?”, dizia a voz, muito animada.

150. “Como assim vai para o ar? Achei que seria descartada!”, disse Casper, que procurava para uma televisão para assistir.

151. Roxanne se aproximou, curiosa, e vendo sua mulher, Casper pediu para irem até uma televisão, um pouco apressado.

152. Indo finalmente até uma TV, Casper esperou pela vinda da próxima notícia do dia, “espera…”, dizia o seu colega de trabalho, do outro lado da linha, “agora!”, disse o colega.

153. “A seguir, temos notícias sobre a anunciação oficial do Al-Mahdi”, disse o âncora do jornal, “nascido em Mexede, o jovem menino é otimista e tem boas novas para trazer ao mundo!”

154. Quando o âncora disse essas palavras, todas as pessoas em volta se alegraram e não tiravam os olhos da TV.

155. Havia uma bandeira negra sobre o santuário de Imam Reza, onde o repórter estava conduzindo a entrevista, e ao fundo, haviam flores e presentes espalhados pelo chão.

156. “7 anos atrás, ocorria uma das maiores tragédias da história de Mexede”, narrava o repórter, enquanto a câmera exibia famílias e fiéis ajoelhados pelo santuário.

157. “um atentado realizado pelo partido Nação de Deus”, continuava o repórter, “um grupo que almejava perseguir e executar o Mahdi, nascido aqui, em Khorasan Razavi, no leste do Irã.”

158. A câmera então volta a mostrar o rosto do repórter, que dizia: “os planos dos sunitas, porém, foram frustrados, pois Deus foi misericordioso com a criança que aqui pisou, e agora, ela está viva para contar a sua história.”

159. O repórter então falou mais algumas coisas para enrolar o público e atrair mais audiência, para só então revelar quem era o Al-Mahdi para todo o país.

160. Quando a câmera se virou, ela apontou então para um belo garoto de cabelos longos e um olhar um tanto sedutor para uma criança.

161. “Yohannan, conte para nós, o que ALLAH disse para você?”, disse o repórter, apontando o microfone para o menino.

162. Balançando seu cabelo, que estava cobrindo seus olhos, o menino diz: “essa é a nova era.”

163. Todas as pessoas que assistiam ao jornal caíram de joelhos no chão, clamando para Deus e louvando glórias, aleluias e “Allahu akbares”.

164. Também haviam pessoas rezando e pedindo perdão pelos seus pecados, pois se o Mahdi estava por perto, o fim do mundo e o arrebatamento também se aproximava.

165. “Certamente, coisas boas estão por vir por aí!”, dizia o repórter, “o que você tem a dizer sobre essa terrível tragédia, Al-Mahdi?”

166. “Em primeiro lugar, peço perdão pelo povo do Irã”, dizia Yohannan, enquanto colocava uma mão no peito, ”e acima de tudo, peço perdão para Deus”, e olhava para a câmera apontando o dedo para cima, “os assassinos de Imam Reza, que tiraram tantas vidas inocentes durante o ramadã, certamente não sabem o que fazem”, disse, balançando a cabeça em reprovação.

167. “Mahdi, quando sua vinda foi anunciada, houve bastante rejeição e, principalmente, perseguição e ameaças à sua família”, dizia o repórter, que não conseguia manter o olhar fixo nos belos e lindos olhos de Yohannan, “como conseguiu lidar com tanta rejeição? Diz para a gente.”

168. “As pessoas tem medo do que não conhecem”, disse Yohannan, balançando seu cabelo novamente, “e eu não julgo os mullahs, pois já apareceram tantos farsantes e falsos messias antes, por que eu seria diferente?”

169. Continuou, Yohannan: “sou diferente, pois as forças das trevas não pouparam esforços para impedir os planos de Deus”, dizia Yohannan, que levantava sua voz e gesticulava com suas mãos, “e não há nada que faça o diabo tremer de medo mais do que sua sentença no juízo final, quando ele e todos os seus seguidores forem julgados pelo todo-poderoso!”

170. Como se estivessem em uma mesquita, todas as pessoas que assistiam ao jornal louvavam e glorificavam ao santíssimo nome de Deus.

171. “É um momento histórico no mundo, meus irmãos e irmãs!”, dizia o repórter, que se ajoelhava para o menino, “Yohannan é o Mahdi!”

172. E estas foram as palavras do Mahdi aos seus seguidores.

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