KALED É O MAHDI!

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X. A Babá

1. Assim disse o Mahdi:

2. Aos 6 anos de idade, Kaled Navid começou a frequentar a escola básica, já com uma certa bagagem de conhecimento e sabendo contar e ler em farsi e árabe.

3. E apesar de muito inteligente, Kaled ainda não sabia fazer divisão de números inteiros, pois sempre que tentava resolver um problema matemático, se irritava e atirava a folha de papel na lareira da casa, queimando-o.

4. No seu primeiro dia na escola, Roxanne arrumou cuidadosamente a sua mochila, ajeitando o seu habitual cachecol em torno do seu pescoço que havia lavado no dia anterior enquanto o menino dormia, pois se percebesse que o cachecol havia sumido, ele faria um grande caos na casa só para procurar pela peça de roupa perdida.

5. Casper então o levou em seu carro e o deixou na frente da escola, e com o sorriso mais belo que uma criança poderia formar em sua boca, Kaled se despediu dos pais, pronto para a primeira aula do dia.

6. Ao voltarem para buscar o menino da aula, porém, perceberam que a diretora os encarava com um imenso olhar de reprovação, irritada com o menino Kaled e dizendo que havia ateado fogo no ventilador da sala de aula.

7. Olhando de baixo para cima para Kaled, Roxanne perguntou ao filho se ele tinha mesmo feito aquilo que a diretora da escola dizia, e olhando para baixo, Kaled dizia que foi sem querer.

8. Mesmo com as desculpas de Kaled, a escola não mais o aceitou, e decepcionados, tiveram de procurar outra escola onde deixar o filho.

9. Casper perguntou ao filho como ele colocou fogo no ventilador, querendo saber se estava aprendendo com alguma coisa na casa que não deveria mexer, mas para sua surpresa, Kaled disse: “Eu só olho para as coisas e as coisas começam a pegar fogo”.

10. Na segunda escola, estavam mais confiantes de que não haveriam problemas, pois os pais haviam feito vários sermões com o filho, dizendo que ele ficaria de castigo se arrumasse confusão.

11. Assim sendo, deixaram o menino novamente em outra escola, onde tentou se comportar e se manter na linha, mas ao retornarem para buscá-lo, receberam outra reclamação de uma professora dessa outra escola.

12. Dessa vez, Kaled havia acidentalmente feito a diretora flutuar, rodopiar no céu e ser arremessada para longe, caindo em em uma poça de lama.

13. Decepcionados, perguntaram então por quê Kaled havia feito aquilo, o que ele respondeu: “Ela era muito malvada, mamãe“.

14. Roxanne perguntou então para Kaled o que essa tal diretora fazia com as crianças, e ele disse: “Falava coisas ruins pra gente e falava que era pra gente ser gente direito, pra gente poder virar soldado e trabalhar na obra de deus.”

15. E se explicando, Kaled dizia que não queria ser pedreiro pra trabalhar em nenhuma obra de deus, muito menos virar outro tijolo na parede e fazer tudo o que as pessoas lhe mandavam.

16. Kaled só obedecia seu pai e sua mãe, e como a diretora da escola não era sua mãe, acreditava não precisar obedecê-la.

17. Após muita procura, os pais conseguiram finalmente encontrar uma terceira escola onde Kaled pôde se adequar e se encaixar sem grandes problemas, apesar de ainda receberem algumas reclamações do comportamento de Kaled, considerado deveras “descontrolado” e “impulsivo”.

18. Na cama, Casper e Roxanne tinham longas conversas sobre a educação do filho e como lidar com seu comportamento imprevisível, pois enquanto uns diziam que Kaled era introvertido e apático, outros diziam que Kaled era bagunceiro e agitado.

19. Os pais bem sabiam que havia algo de diferente no menino, e não se referiam apenas à estrela de oito pontas que raramente se iluminava em sua testa e era escondida de todos por trás da franja de Kaled.

20. Casper afirmava que, ao completar 12 anos de idade, o melhor para seu filho seria levá-lo à um programa de crianças com superdotação, o SAMPAD, onde suas capacidades poderiam ser melhor desenvolvidas.

21. E enquanto o menino estudava na escola, Casper fazia suas reportagens para a televisão iraniana e Roxanne passou a vender fotos para os jornais.

22. Mesmo com o trabalho, os pais dedicavam bastante tempo para cuidar de seu filho e lhe dar bastante amor e carinho, mesmo porque a maneira diferenciada pelo qual Kaled enxergava o mundo exigia maior atenção dos pais.

23. Kaled era especial e diferente dos demais, muito diferente dos demais.

24. Contudo, Roxanne e Casper se ausentariam do filho por três dias, pois foram chamados para cobrir um terremoto que ocorrera no Iraque, além de ajudar as famílias necessitadas.

25. Apesar dos conflitos entre ambos os países, os iranianos gostavam de ajudar aos iraquianos, pois os interesses de seus políticos, seja de Haram Shnein, Abdul Al-Hazmi ou Ali Qasim, não barravam a compaixão e o amor uns com os outros.

26. Seus pais não costumavam ser ausentes com Kaled por conta de seus trabalhos, afinal, Casper costumava escrever seus textos em casa e Roxanne apenas fotografava ocasionalmente ao participar de um grande evento.

27. Mas Casper já não era mais colunista e Roxanne já não era fotógrafa autônoma, e com tantas oportunidades de carreira surgindo, os pais não puderam recusar tais chances.

28. E seria demasiadamente trabalhoso cuidar de Kaled em meio á ajuda humanitária no terremoto, pois apesar de ser um menino calmo e fácil de se lidar, ou ao menos, na maioria das vezes, a correria do trabalho poderia afastá-los da criança de qualquer maneira.

29. Assim, houve a necessidade de contratarem uma babá para cuidar de Kaled por alguns dias, pois não haviam diaristas ou serviçais na mansão.

30. Chegara então o dia em que o embarque para a cidade de Bagdá se aproximava, e com suas malas na sala de estar, o casal aguardava a vinda da babá em uma minivan.

31. E melancólico, o filho abraçava as pernas de seus pais constantemente, sendo arrastado pelo chão e não querendo que o deixassem sozinho.

32. Consolando-o, Roxanne dizia: “Não chores, filho meu, a sua nova babá vai cuidar muito bem de você!”

33. Kaled não queria saber de babá, e sim de sua mamãe e do seu papai, mas os pais não poderiam mimá-lo o tempo todo, pois sabiam que, alguma hora, teriam de se ausentar do filho por alguma necessidade ou urgência.

34. A campainha então tocara na porta dos Navid, e após Casper abrí-la, pôde ver uma mulher lhe cumprimentando e perguntando se estava na casa do casal que haviam contratado uma babá.

35. Convidando a mulher para entrar em casa, Casper chamou Kaled para conhecer sua babá, com quem seria cuidado e protegido por 3 dias enquanto os pais viajavam até Bagdá.

36. E quando Kaled viu a mulher, a admirou e percebeu que tinha pele retinta e olhos claros como a luz do luar, e além disso, seu nome começava com “M”.

37. E com um sorriso crescendo no rosto do menino, ouviu seu pai lhe apresentar a mulher:

38. “Kaled, essa é sua babá, Mera.”

39. E o sorriso de Kaled sumiu tão rápido quanto a velocidade da luz.

40. “Oi Kaled! Quem é o bom garoto? Quem é?”, dizia Mera, a babá, brincando de esconder o rosto.

41. Até Casper, que sempre costumava olhar o lado bom das pessoas, achou a babá meio estranha, pois Kaled já era moço demais para essas brincadeiras de bebê.

42. Casper então foi até sua esposa e perguntou: “Amor, de onde você conhece essa babá?”

43. Também desconfiada, Roxanne disse: “A Samira me recomendou, pois já cuidou da filha dela algumas vezes.”

44. “Samira conhece umas pessoas estranhas”, disse Casper, que olhava para Mera.

45. A babá, chamada Mera Merida, trazia algumas malas para poder ficar na casa dos pais de Kaled, já as levando para dentro da mansão.

46. Roxanne, porém, percebeu que havia outra “bagagem” dentro da casa, e era do exato tamanho de um tigre-de-bengala.

47. Calmamente, Roxanne virou-se até Mera.

48. “Mera, certo?”, disse Roxanne até Mera.

49. “Sim, Mera”, disse Mera.

50. “Por que tem uma mala do tamanho de um tigre-de-bengala dentro de casa?”, disse Roxanne para Mera.

51. Suando frio, Mera olhou para os lados e disse: “São as minhas roupas.”

52. Os pais bem queriam questionar a babá e lhe fornecer mais instruções, mas ao olhar em seu relógio de pulso, Casper percebeu que o horário do vôo até Bagdá se aproximava rapidamente.

53. Decidindo então acreditar que não havia um tigre-de-bengala dentro da mala do tamanho de um tigre-de-bengala, Roxanne apenas reforçou á babá que a mansão estava em seus cuidados e que ela deveria manter a casa limpa e bem cuidada.

54. Casper também advertiu, tanto para Mera quanto para Kaled que, se alguma coisa fora do comum acontecesse, deveriam ligar para seus pais.

55. Kaled, que estava de pé na porta da mansão, olhava choroso para os pais e implorava: “Mamãe! Papai! Não me abandonem!”

56. Os pais então se despediram do filho pela última vez, e dando um último abraço e um último beijo na testa, os pais disseram ao menino: “Nós te amamos muito, Kaled”.

57. E andando de costas pela porta, acenavam e mandavam beijinhos ao filho, que os olhava como se fosse um anjinho.

58. Ao abrirem apressadamente as portas do carro para manobrá-lo na rua, os pais sumiram no horizonte enquanto acenavam repetidamente para o filho e a babá, que os observavam na porta da mansão.

59. Virando-se e fechando a porta de casa, Mera então espreguiçou suas costas.

60. “Bom, é isso, eu vou ficar no quarto deles agora”, disse Mera.

61. E Kaled, que desconfiava de Mera, a observou subindo as escadas.

62. Abrindo a porta do quarto dos Navid, Mera deixou suas malas, tomou um banho e foi dormir para ter uma boa tarde de sono.

63. Mera, contudo, começou a ouvir o som sereno e melancólico de uma flauta no andar de baixo, e tentou esquecer a música, remexendo-se na cama.

64. A música, que era bela e bonita, expressava a saudade que Kaled sentia de seus pais, mas Mera tinha sono e tentava abafar o som com seu travesseiro, e de nada adiantavam seus esforços.

65. Irritada, Mera desceu as escadas para ordenar ao menino que cessasse a música, o que ele prontamente parou e o som de sua ney foi silenciada.

66. Satisfeita, Mera subiu as escadas novamente para voltar ao quarto dos Navid e dormir.

67. Mas logo, a melodia da flauta persa havia retornado.

68. Irritada, Mera desceu mais uma vez as escadas, ameaçando quebrar a flauta de Kaled se ele não parasse de tocar a música, e mais uma vez, Kaled parou de tocar a flauta e Mera subiu ao quarto para tentar dormir novamente.

69. E sem nem ao menos conseguir alcançar a cama para deitar-se, Mera ouviu outro instrumento musical no andar de baixo, pois dessa vez, Kaled tocava um santur.

70. E assim se sucedeu com a tar, a kamancheh, o tanbur, a setar, a dotar, a barbat e a gheychak de Kaled, todos presentes dos amigos e amigas de seus pais, que percebiam que o menino tinha um grande talento para a música.

71. Tantos instrumentos depois, os olhos de Mera ficavam vermelhos de tanto estresse e impaciência, não sabendo o que fazer com o menino.

72. Assim, Mera teve uma ideia e desceu até a sala de estar, onde estava sua mala do exato tamanho de um tigre-de-bengala.

73. Rindo para si mesma, Mera dizia: “Agora esse menino vai ver só”.

74. E então, Mera começou a destrancar a mala com o exato tamanho de um tigre-de-bengala, um mala onde poderia ou não haver um tigre-de-bengala, talvez um tigre siberiano, talvez um leão, ou talvez um animal completamente diferente, como um jacaré, um lobo ou dragão-de-komodo.

75. Tal qual o gato de schrödinger, era impossível determinar se havia um tigre-de-bengala na mala, de fato, pois barulhos não eram ouvidos e a mala se mantinha quieta e imóvel.

76. Só era possível saber se havia um tigre-de-bengala se Mera a destrancasse.

77. E destrancando a mala, um enorme tigre-de-bengala saiu da mala.

78. Com o tigre-de-bengala solto na sala, Mera imaginara que o tigre avançaria até Kaled e o devorasse vivo.

79. O tigre, porém, caminhou lentamente até Kaled e virou sua barriga para cima, pedindo por carinho com uma de suas patinhas, ou melhor, patas.

80. E como o tigre era muito maior do que um gato qualquer, Kaled subiu em cima do tigre, sentando em seu abdômen, para poder lhe fazer carinhos e cosquinhas.

81. Depois, o tigre se levantou e os dois foram brincar de caçar a luz da lanterna de Kaled no jardim dos Navid.

82. Incrédula, Mera viu seus planos frustrados e subiu ao quarto dos Navid.

83. Ao menos não havia música, então ela conseguira dormir em paz.

84. No segundo dia, Mera acordou bem cedo para acordar Kaled, que era dorminhoco e era difícil de despertar, e pelo mesmo motivo, era também era difícil de banhar.

85. Kaled brincava com bolhas de sabão e encharcava as roupas de Mera com a água da banheira, como também era com a sua mãe Roxanne, mas diferente da mãe, Mera repreendia o menino e mandava ele se comportar.

86. Levando o menino até a escola em sua minivan, Mera gozou do conforto e da prosperidade da mansão dos Navid até a hora em que retornou até a escola para buscar Kaled.

87. Chegando na escola, notou que as crianças se amontoavam perto de Kaled, pois ele contava histórias sobre seus sonhos e os livros que lia como se fosse tudo verdade, e ao mesmo tempo, contava vivências que pareciam fantasiosas, mas eram reais.

88. “Eu vi doze estrelas no céu, sim eu vi”, dizia Kaled aos olhares aficcionados, “e elas brincavam de ciranda em volta de mim".

89. “O sol brincava com as estrelas?”, perguntou uma criança, “E a lua? ela brincava de ciranda?”, perguntou outra criança.

90. “Não, eu estava em cima do sol!”, dizia Kaled, irritado, como se estivesse explicando algo óbvio, “as estrelas e os planetas giram em torno do sol!”

91. “A lua gira em volta do sol?”, perguntou uma criança.

92. “Não, a lua gira em volta da Terra!”, disse Kaled.

93. “A Terra também brincava de ciranda?”, perguntou uma criança.

94. “Não sei, acho que sim”, disse Kaled, confuso.

95. “Mas pessoas ficam em cima da Terra, não em cima do sol!”, disse outra criança.

96. “Será que tem como ir até o sol?”, perguntou uma criança.

97. “Será que tem como ir até o sol?”, perguntou uma criança.

98. “Eu acho que só quando fica de noite”, disse uma criança.

99. Enquanto Mera observava tudo, as crianças começavam a discutir se era possível viajar até o sol ou não, mas como a babá era impaciente, apressou então o menino Kaled para voltar para casa.

100. As crianças perguntavam para Kaled quem era a nova moça, se era sua tia ou alguém da família, e então, Kaled explicou que Mera era sua babá, pois seus pais estavam viajando para ajudar pessoas em uma cidade onde tremeu muito.

101. As crianças então riam de Mera, como se ela fosse uma serviçal de Kaled e como se ela fizesse tudo o que Kaled mandava.

102. “Ela me deu banho e me deu comida”, dizia Kaled, “como se eu fosse um príncipe!”

103. “Mas para ser príncipe, tem que ser filho de rei e rainha!”, dizia uma das crianças.

104. “Mas ele disse que a mãe dele é uma rainha!”, falou então uma criança.

105. “Não, foi o pai dele quem disse para ela”, disse uma criança.

106. E após muitas conversas sobre os pais de Kaled serem reis ou rainhas, as crianças perceberam então que o menino estava sozinho com sua serviçal em sua mansão, e se não tinha rei ou rainha na mansão, então Kaled era o novo rei da sua casa.

107. E brincando de faz de conta, as crianças começavam a saudar: “Viva o rei Kaled! Viva o rei Kaled!”

108. Mera olha para o menino e as crianças com um olhar meramente frio e inexpressivo, pois lhe irritava como as crianças agiam de forma exagerada e forçada.

109. Viu chegar então uma professora, que tinha o olhar cansado e as costas doloridas. Ao ver Kaled e as crianças, afirmou para Mera que o menino era o demônio encarnado.

110. Mera tentou entender o porque de tamanho julgamento contra o menino, e percebendo a inocência de Mera, a professora lhe advertiu:

111. “Você não sabe do que esse menino é capaz! Você não sabe!”, dizia a mulher, com os olhos arregalados, “Ele levita as crianças com a força da mente! Ele queima os brinquedos com seus raios laser! Em uma hora ele está em um lugar, em outra hora, está em outro! E ele sempre sabe o que estamos pensando ou fazendo! Pois ele lê as nossas mentes!”

112. Mera ficou em silêncio, e então, olhou para Kaled, que sorria o sorriso mais bobalhão que já havia visto em toda sua longa vida.

113. “Meus amigos gostam quando eu faço eles voarem”, disse Kaled, que esfregava um dos seus pés no chão enquanto olhava para baixo e encostava a ponta dos dedos indicadores.

114. “Ele é que nem o Peter Pan, moça!”, disse um garoto banguela para Mera.

115. “Ele é o anticristo! Isso sim!”, disse a professora, descabelada e apontando o dedo para Kaled, “ele é filho de Iblis!”

116. “Eu sou filho da minha mãe, moça”, disse Kaled, ingênuo.

117. Não querendo arranjar mais confusão, Mera saiu com o menino Kaled para fora da escola, levando um bilhete da diretoria que avisava aos Navid que o menino não era mais bem vindo na instituição.

118. Deixando então a escola, Kaled conta para Mera tudo o que aconteceu na sala de aula, sobre como fez um brinquedo se mexer sozinho, como transformou as cadeiras em carroséis e como fez os livros voarem como pássaros, para o tormento da professora.

119. “Você parece um diabinho”, dizia Mera, “seus pais me disseram que você era mais comportado”.

120. “Eu sou comportado, moça”, dizia Kaled, sorridente, “eu deixo as pessoas felizes quando eu faço as coisas ganharem vida, que nem é no meu jardim!”

121. “Por outro lado, você deixa outras pessoas com muita raiva”, disse Mera, se referindo às professoras.

122. “Elas ficam com raiva porque são todas chatas”, disse Kaled, “eu só estou sendo gentil. É que nem meu pai e minha mãe me falam: gentileza gera gentileza!”

123. “Se você acha”, disse Mera, destrancando a porta da mansão e entrando junto do menino.

124. Com a voz cansada, Mera fechou a porta e disse para Kaled: “Bom, o que acha de ir dormir, nenê?”

125. “Eu não sou neném e não quero dormir”, disse Kaled, “eu quero assistir desenho“.

126. “Mas eu estou cansada”, disse Mera, “você e o tigre-de-bengala sujaram toda a casa com lama e tive que limpar tudo.”

127. Kaled, porém, não queria dormir de jeito nenhum, e começou a chorar um choro mais alto que 500 bombas atômicas e 600 terremotos, fazendo todos os móveis da casa se mexerem e voarem, como se um poltergeist estivesse dentro da casa.

128. “Tá bom! Tá bom!”, gritou Mera, que olhava para o lado para os choros de Kaled não continuassem lhe atormentando.

129. Quando Kaled enfim parou de chorar, o que foi em um instante, Mera foi buscar um filme para assistir.

130. Acendendo então a lareira da sala de estar, Mera procurou por um desenho animado em um dos móveis, e então, achou um DVD de um desenho sobre ninjas e piratas.

131. Kaled lhe chamava, impaciente, e assim, Mera levou o desenho para colocar na TV.

132. Com o menino enfim distraído, Mera então foi até o quarto dos pais de Kaled, onde deixara suas malas para dormir e aproveitar seus 3 dias de estada.

133. E dentro de algumas malas, haviam roupas charmosas e de alto padrão, mas também havia uma gaiola cheia de jibóias.

134. “Acalmem-se, meus amores”, dizia Mera para as jibóias, “a hora do lanchinho de vocês já vai chegar”.

135. “Eu também gosto de cobras”, disse Kaled, que estava olhando as jibóias ao lado de Mera.

136. Tomando um susto, Mera se virou, dizendo: “Você não estava assistindo desenho?”

137. “Estava, mas sem você, estava muito chato”, disse Kaled, “queria que você viesse ver desenho comigo”.

138. “Agora não, tampinha”, dizia Mera que escondia as jibóias na sua mala.

139. “E elas são serpentes ou víboras, dona Mara?”, perguntava Kaled, inocentemente.

140. “São jibóias da amazônia, seu enxerido”, dissera Mera, escondendo a mala debaixo da cama, “e o meu nome é Mera”.

141. “E você já foi pra amazônia, dona Mera?”, perguntava Kaled, lhe seguindo.

142. “Já, já”, ela dizia, impaciente, “mas faz muito tempo. Por que estou falando contigo?”

143. “O desenho que estou assistindo tem muitos bichos, tipo jacarés e pica paus”, dizia Kaled, “mas se você gosta de cobras, também tem outro desenho. Eu também gosto muito de cobras, tia. Elas fazem remédios, sabia?”

144. Se acalmando um pouco, Mera ficou um pouco curiosa com o garoto e lhe respondeu:

145. “Não são as cobras que fazem remédios, é o veneno delas que servem para que os médicos façam antídotos para o próprio veneno delas, e não remédios.”

146. “É sério, tia?”, dizia Kaled, “que legal! O veneno pode curar?”

147. “É óbvio que pode, eu faço esses antídotos o tempo todo”, respondeu Mera.

148. “Me ensina a fazer um antídoto, moça?”, perguntou Kaled para Mera.

149. E Mera lhe olhava de cima para baixo, fitando os olhos brilhantes e claros de Kaled.

150. Dentro da cozinha da mansão, Kaled e Mera vestiam máscaras e luvas azuis.

151. “Você coloca esse béquer nesses dentes pontiagudos”, ensinava a babá, “e então, dá uma forçadinha na cabeça, sem machucar o bichinho”.

152. “Uau, isso é o antídoto, tia Mara?”, dizia Kaled, que segurava o béquer enquanto Mera segurava a jibóia.

153. “Primeiramente, já falei que meu nome é Mera. Segundo, isso é veneno e é muito perigoso na mão de crianças teimosas”, alertava Mera, que arrancou o béquer da mão do menino, “a gente usa esse veneno aqui pra transformar em antígeno”.

154. “Uau, você cria antídoto com o veneno da cobra, tia?”, dizia Kaled, o que Mera prontamente o interrompeu para corrigí-lo:

155. “Não, meu bem. O veneno serve pra fazer antígeno, e é com o antígeno que a gente consegue o soro antiofídico, que é o antídoto pra veneno de cobra.”

156. “E como que transforma tígeno em soro físico, tia Mera?”, perguntava Kaled, curioso e errando a pronúncia de algumas palavras.

157. “Bom, depende muito do organismo e dos anticorpos, fazer soro antiofídico é como fazer uma vacina, você injeta o antígeno no sangue de algum animal e depois de um tempo retira os anticorpos do animal, que agora são mais resistentes ao veneno de cobra. Com os anticorpos, a gente consegue finalmente criar o antídoto, que é o soro antiofídico.”

158. Enquanto ouvia a conversa de Mara, Kaled havia bebido o béquer com veneno de cobra sem que ela percebesse, como se fosse só um suco de laranja.

159. Calma, Mara é a outra. Essa aqui é a Mera, perdão.

160. “E então? Agora entendeu?”, disse Mera, olhando para Kaled.

161. “Agora eu entendi, tia”, disse Kaled, e mudando completamente de assunto, falou: “você quer ver desenho comigo?”

162. Olhando para a jibóia no balcão, Mera pensou um pouco e concordou com a ideia do menino, guardando todos os seus materiais e colocando sua jibóia de volta à sua jaula.

163. Mera e Kaled então assistiram desenhos por toda a tarde, deitados no sofá e caindo no sono.

164. Ocasionalmente, Kaled despertava para pedir para Mera colocar o desenho de novo, para que assim reassistissem o mesmo DVD por repetidas vezes.

165. Os dois descansaram no sofá por horas, e após 7 repetições de DVDs, Kaled finalmente adormecia, pois era de noite e era hora de dormir.

166. Levantando-se devagar do sofá, Mera olhou para o menino, que adormecia como se fosse um anjo sem asas.

167. Ao estreitar seus olhos e se aproximar mais do menino, pôde perceber então que a franja que cobria suas sobrancelhas também cobria algo mais, e por isso, pôs sua delicada mão para revelar o sinal na testa do menino.

168. Ao olhar para a estrela de oito pontas, Mera se assustou e andou para trás, com medo.

169. O medo então deixou o seu corpo ao admirar a tranquilidade com a qual Kaled dormia no sofá, apoiando sua cabeça em uma das mãos enquanto a outra mão se apoiava sobre sua perna.

170. E convenientemente, a mão que estava debaixo de sua cabeça tinha dois dedos levantados, da mesma forma que a mão que estava apoiada em sua perna.

171. “A obra prima”, disse Mera, ao observar o garoto.

172. Mera hesitava ao olhar para o menino, sem saber como deveria agir ou o que deveria fazer.

173. Foi então que Mera ouviu o barulho de um pássaro, e quando se virou, viu penas negras espalhadas pelo chão.

174. E nos umbrais da mansão dos Navid, havia um corvo que observava Mera com um imenso olhar de reprovação, como se debochando ou desdenhando da mulher.

175. “Eu sei o que deve ser feito”, dizia Mera, “não tenho medo da marca.”

176. O corvo, no entanto, fitava Mera e não se distraía com mais nada, como se estivesse aguardando alguma ação de Mera.

177. Assim, após um longo suspiro, Mera subiu até o quarto dos Navid, trazendo consigo uma jaula cheia de jibóias.

178. Observando o jovem Kaled, Mera colocou a jaula em cima do sofá e posicionou sua mão sobre a portinhola por onde os répteis poderiam escapar.

179. “O menino já domou um tigre”, disse Mera consigo mesma, “mas é incapaz de domar as serpentes, livres e rebeldes”

180. Além do que dizia, porém, Mera hesitava demais para fazer alguma coisa.

181. Ao grito furioso do corvo, que gralhava contra Mera, a mulher finalmente abriu a jaula, deixando escapar várias jibóias que rastejaram pelo corpo do menino Kaled.

182. Vou dividir essa surate em dois, pois está ficando muito comprido e eu quero comer uma pizza.

183. E essas foram as palavras do Mahdi aos seus seguidores.

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